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sexta-feira, 12 de junho de 2015

Vai ter greve sim! Não haverá aula! Mas, teremos aprendizado! Depende de cada um


Acontece que cansou ver gente falando mal da greve e dizendo que quer aula, que não quer estudar no natal e no carnaval. Pra começar, se estudar no natal, carnaval, Boi-Bumbá, Paixão de Cristo, Pentecostes, Dias das Mães ou aniversário da MÃE (ops) é um problema, acho melhor repensar a ideia de problema. Creio que haja algum problema na formação (atenção a essa palavra) desses indivíduos. É sério que essas datas são tão mais importantes que sua formação? Vocês acham realmente que quando continuarem os estudos ou estiverem trabalhando terão tempo e mesmo paciência pra isso?
Na semana passada, na sala de um grupo de pesquisa, uma colega de curso perguntou para todos na sala: “E aí, como foi o feriado?” (referindo-se quinta-feira, 4 de junho, Corpus Christi). Quase que instantaneamente eu e uma amiga respondemos: “Que feriado?!”.
Não é brincadeira e nem exagero. O feriado não existiu, estamos estudando como loucos e desesperados. Muitas vezes eu mal sei em qual dia da semana estamos. Ahhh, o Helder é todo ateu, punk, anticristo e bla blá blá. Ok...rs. A pessoa que fez a pergunta é uma amiga muito religiosa, daquelas que conhecemos como praticantes e fieis. Ela mesma confirmou que também faz tempo que não sabe o que são feriados. Fizemos uma escolha: estudar e nos formar. Formar significa adquirir formação. Formar não é colar grau e nem pegar diploma. Afinal, educação superior e pós-graduação não são obrigatórias que nem a educação básica. Escolhemos isso e foi muito difícil passar nos exames de admissão da faculdade e do mestrado. Lutamos tanto pra esquecer isso por qualquer feriado? [Usei a mesma palavra três vezes no mesmo parágrafo de propósito!].
Há mais de um ano me mudei pra Manaus por conta do mestrado. Não estive presente com minha família nas datas acima citadas (a maioria nunca me importou). Dia das mães e dos pais e o aniversários dos respectivos, esses sim muito me importam. Não presenciei. Meus pais? Compreenderam até mais do que eu. A falta que eles fazem é grande.
Em 2013 e 2014 meu aniversário caiu na data do Intercom Norte, importante evento da área de comunicação. Mas eu fiz uma escolha: Escolhi me formar. De quebra, fiz amigos maravilhosos. Estudantes e profissionais dos estados da região norte (isso apenas na etapa norte do evento), que hoje fazem o possível para que possamos nos encontrar e que com toda certeza, no futuro, serão parceiros nas atividades cientificas e profissionais.
Pra concluir e não finalizar. Reflitam. Alguns feriados valem mais que a formação? Você é uma pessoa em sala de aula e outra no feriado? Tem algum problema nessa história. Não que devamos esquecer o feriado e as diversões. Mas há uma situação muito crítica no mundo, no Brasil e nas universidades e creio que isso seja mais importante que um natal ou carnaval livre.

Em 2012
Em 2012 houve uma greve da qual a maioria lembra. Na época eu era aluno de graduação. Em Parintins os alunos não conseguiram se mobilizar efetivamente. Alguns colaboraram como podiam e ajudaram professores e técnicos na maior paralização das universidades brasileiras, com adesão de 95% das Universidades e Institutos Federais de Educação Ciência e Tecnologia.
Eu sabia e via cotidianamente que as condições de trabalhos nas universidades eram (e ainda são hoje) muito ruins. Mas, só sabia isso. Resolvi junto com alguns amigos e outras pessoas (que se tornaram grandes amigos por causa da greve) me aproximar do comando local e participar das reuniões. Afinal, eu não iria pra casa ficar bestando ou acompanhar tudo pela TV.
Descobri que os professores e técnicos tinham um plano de carreira ruim. Não recebiam reajustes acima da inflação há algum tempo (coisa básica, obrigatória). Descobri o que é esse tal de REUNI que muita gente fala. Ele criou o curso de Artes Visuais (na época Artes Plásticas) em Parintins. O curso começou com o professor de fotografia, do colegiado de jornalismo; O professor de teoria e ética, também do colegiado de jornalismo, que por um tremendo acaso estava cursando doutorado em sociologia e estudava estética; e a professora de língua portuguesa, transversal. É difícil de crer né? E se eu falar que até hoje esse curso não tem nenhuma estrutura própria? Desde aquela época a Ufam de Parintins ganhou um novo complexo, com três prédios de dois andares cada. Nada do bloco de artes, que ainda é um sonho para os alunos, técnicos e professores.
Descobri que a Dilma é “malvada” (mentira, eu já sabia! Percebi que o problema é muito maior). Conheci MUITO da realidade política, econômica, educacional e social do Brasil. Conheci a Ufam. Sem falsa modéstia, hoje sei da estrutura organizacional e política dela, conheço algumas resoluções e trâmites internos mais que muitos professores técnicos. Muita coisa ficou clara pra mim.
Percebi que apesar de todas as dificuldades que a universidade Brasileira e latino-americana passam, ainda assim elas são exemplos de instituições que realmente agem e transformam a sociedade – outra hora cito as inúmeras ações que fizemos, apenas em Parintins.
Percebi que a Ufam é um só um peixe em um rio tão grande quanto o Amazonas. Sobre esse contexto, vale a pena o texto do professor Sergio Lessa, disponível aqui. O texto é de 1998, mas como é atual.
Desculpem-me a falta de modéstia, mas a minha formação foi muito melhor que a dos alunos que não participaram ativamente da greve ou mesmo não passaram por uma. Aprendi coisas que todo jornalista (minha graduação) deveria saber. Tudo que não havia na minha grade curricular, economia, história, economia-política da mídia, a perversa política partidária etc. Eu aprendi coisas que só se aprendem na vida. A greve teve muitos ganhos, aprendemos com isso. Mas tivemos derrotas e cada vez que tocamos no assunto, eu sinto a tristeza e gosto amargo dos golpes que um governo e um sistema perverso podem armar, inclusive, inúmeras ações inconstitucionais, como a criação de um sindicato aparelhado e feito por pessoas do próprio governo.
Como jornalista, fiz coisas que desde então nunca fiz. Escrevi matérias, releases, fizemos comunicação estratégica, mailing, clipping e avaliação de impacto e alcance de nossa comunicação. Vi pessoas e grupos criarem interesse em certos temas, ações e problemas em função de nossas informações e atividades. Estudei muito pra escrever sobre a carreira docente, orçamento e sua aplicação na educação. Sistemas educacionais e seus prós e contras. Tudo isso, sem um único dia de aula. Sem a obrigação de fazer relatório, entregar trabalho ou “pegar presença”. Ainda assim, se nada disso desse certo, eu ainda seria uma pessoa muito melhor.

Sobre o Icsez
Não é novidade que fiz minha graduação na Ufam de Parintins, o Instituto de Ciências Sociais, Educação e Zootecnia (Icsez). Por isso, até hoje, conheço melhor o contexto de lá. Desde já, desculpem não citar todos os cursos.
Meus amigos estudantes de jornalismo. Há uma greve em curso. A comunicação e o jornalismo são armas e serão usadas das formas mais promiscuas possíveis. É nossa obrigação conhecer a realidade que nos cerca e contra-atacar.
Amigos estudantes de pedagogia e educação física. Educação não é apenas em sala de aula. É muito mais que a sala de aula. Agir é também é educar, seja o outro ou nós mesmos. “Ser professor e não lutar é uma contradição pedagógica”, disse Paulo Freire.
Amigos das Artes Visuais. Filmes, pinturas, esculturas, performances e etc, muitas vezes explicam mais coisas e de forma mais clara que muitas teses. Todos sentimos dor pelos cortes na educação e pela precarização da educação. Ajudem a pessoas a ficar uma noite sem dormir pensando nisso.
Amigos do Serviço Social. Em cada aula, tenho certeza que é perceptível o quando a profissão de vocês terá cada vez mais trabalho. Vocês devem notar que as contradições estão postas e precisam ser superadas.
E por fim, aos alunos de administração. Cerca de 9 bilhões foram retirados apenas da educação. A inflação está alta. Há problemas de gestão em todas as esferas e nos três poderes. Não é possível que isso não cause alguma indignação em vocês, além de vontade de conhecer a fundo e discutir como melhorar esse cenário.

Gente, para que vocês querem aula nesse momento? Vocês tem uma oportunidade única de mostrar porque estudam e porque vale a pena o investimento em vocês. Se realmente acham que a greve não vale de nada e que não há como ter aprendizado e formação nesse momento, me desculpem! Mas parece que esse corte de 9 bilhões foi feito porque investir na educação não está valendo a pena.

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